Cheguei a essa conclusão hoje, com um fato quotidiano e refletindo em
outros que me aconteceram.
Fui levar Mariles para vacinar. Entrei com ela na salinha e a
enfermeira logo foi dizendo: Vamos deitar ela aqui na maca... Eu disse
que não, que ela iria ser vacinada no meu colo. Ela disse que na maca
era mais fácil para a outra moça segurar. Eu disse simplesmente: sou
eu quem vou segurar.
Juro que o tom não foi agressivo nem defensivo. Foi apenas definitivo.
A vacina foi aplicada e eu praticamente esqueci do fato.
Meses depois, o Vi foi levar a Ma para fazer exame de sangue, há quando
do seu episódio de anemia ferropriva. Chegou ele lá, cego, segurando um
bebê e sem acompanhante. A enfermeira não hesitou: tirou a ma do colo
dele. E ele ficou indignado. Chegou lá em casa "nos cascos", rosnando
contra o preconceito das pessoas e o desrespeito. Só pude concordar, mas
fui incapaz de não perquirir: mas por que você deixou??? Ele embatucou.
Depois, disse que simplesmente "não conseguiu reagir na hora".
Lembrei de casos que vivi. Casos nos quais eu não consegui reagir. E
encontrei a raiva que ele estava sentindo. E achei ter percebido porque
ele ficou chateado e eu, não; e porque eu me chateava tanto antes e não
me chateava agora.
Kevo nasceu. O povo era dono de puxar ele do meu colo. Eu ficava
possessa! ME sentia aviltada como mãe e mulher e ser humano. Tinha
vontade de gritar. De xingar. Depois, passou, porque eu apenas passei a
dizer "não". Quando puxavam, eu puxava de volta: ela vai ficar aqui.
Porque eu sabia que ali era o melhor lugar para ela. Que uma pessoa que
não me respeitava, não tinha mais direito de pegá-la no colo que eu.
HHoje a Ma precisou fazer exame de sangue denovo, para continuidade do
tratamento da anemia. Eu pedi que o Vi fosse, e lhe disse: se eles
tentarem tirar ela de você, não deixe. Você é o pai. Você tem direito.
Eles só vão acreditar que tem capacidade de segurar sua filha, se você
lhes disser isso.
Aconteceu até pior. Disseram que iam colocar a Ma na maca para fazer
exame (um detalhe: no mês anterior eu fora e ela fe3z no meu colo). Ele
disse que não. A mulher insistiu. Ele voltou a reinterar. Ela chamou
outra. Ele voltou a negar. Leve tensão. Fizeram o exame com a Ma no colo
dele. E ele voltou sem raiva, mesmo o preconceito tendo vindo de duas
pessoas, não apenas de uma, como foi na primeira vez. .
Alguns diriam que é porque sua vontade foi respeitada no final. Pode
ser. Mas penso que a pedra de toque tenha sido a reação.
Quando nos tratam com preconceito e não reagimos, é como se
concordássemos com a pessoa. A raiva é dela, mas também é por nós, por
nossa c onivência; quando reagimos, dizemos a nós mesmos que aquela
visão diminuída a nosso próprio respeito não nso pertence, mas apenas à
inexperiência da pessoa que a tem. Nossa reação deixa o preconceito com
a pessoa, não conosco; faz-nos acreditar mais em nós mesmos e nos
respeitar também. Limita o acesso do outro a nossa auto-estima.
Pensamos que a reação é para o outro; qual nada! Somos nós os
principais beneficiados.